a outra-paisagem

para ana rüsche

vi a Cidade afundar na língua das águas
feita da mesma falha
que move os navios 

& o Poder 
submerso


— este é o sonho

: nadar e nadar aqui 
dentro


de um naufrágio
coletivo

nadar e nadar agora 
no céu:
quando se faz
do corpo uma cartografia


de mergulho e salto

enquanto seguimos
no fundo
no fundo
de um sonho antigo

isto é migrar: ser gente 
movida pelo sopro
(o invisível)

da respiração
& dos ventos


ser gente
movida pelo fogo
invisível

no corpo e no alimento

: matéria de um povo
ainda acolhido na língua das águas
na língua
que nos funda

até avistar a terra
onde agora somos
as mínimas sementes
(o avesso
de estátuas e relíquias)

e podemos florescer

somos
a outra-paisagem: isto é
o futuro agora

onde se desembaralham
as línguas
das torres em ruínas


e somos
outra vez
: um jardim ou uma floresta

maiara gouveia
sp. dez. 2021.


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