SPIRITUS
Sonhei outro dia com uma aula a partir da palavra “spiritus”. “Spiritus” é um termo do latim que pode ser traduzido como “sopro”.
Algo é invisível e vital como “spiritus”. Algo é invisível e vital como o sopro (respiração). Elidimos a comparação. Sobra uma metáfora.
Espírito, portanto, é uma metáfora.
Ritmo e metáfora sustentam a linguagem poética. A poesia é a linguagem que estabelece relação com o desconhecido (invisível). A poesia é um ato e fabrica essa transição extraordinária entre o estabelecido e o desconhecido (invisível) e cria pra esse enigma um tipo de visibilidade. A poesia é o motor de toda a linguagem verbal.
A realidade é intocável. Dito de outro modo: o em si de algo é um enigma. As relações com esse enigma começam no poético. Tornar intimamente conhecido um enigma (o invisível, o desconhecido) é a aspiração do poético. Quando o poético ilumina essa região não vista e faz dela neblina ou clareira ou código, a filosofia pode estudá-la e a ciência pode torná-la útil. Mas nada é possível sem que se ouse tatear os sons até encontrar uma síntese, uma metáfora, a antecipação da palavra. A poesia é esse achado.
POIESIS
Fiz essa pequena introdução pra sublinhar a importância da história de uma palavra. A história da palavra poesia nos leva ao conceito de poiesis. Confeccionar algo a partir de uma matéria preexistente (fazer da argila um vaso, por exemplo) é a tradução aproximada do verbo que origina o conceito poiesis. O resultado desse ato de modelar, arrancar da matéria outra forma seria a poiesis. A ideia de poiesis como criação a partir de palavras e ideias surge muito tempo depois dessa primeira acepção.
Homero chama o tipo de composição que faz de canto, discurso, relato, não de poesia. Construir com engenho é o objetivo de alguém que ergue uma edificação ou molda uma escultura, e esse é também o modelo de composição poética na sociedade em que a Odisseia foi composta. Os poetas se diziam aedos, não poetas. Aedo quer dizer “aquele que canta”, “cantor”.
No século V, surge uma distinção entre aquele que compõe e aquele que interpreta a composição, então o cantor continua a ser chamado de aedo e o compositor começa a ser chamado de poeta. A partir dessa distinção, surge em relação a poiesis, esse conceito abrangente de fabricação criativa, a noção de um artefato próprio do poeta, o poema.
O conceito de poiesis é muito fértil e tem muitos desdobramentos em estudos de literatura e de filosofia.
Mais adiante, vamos falar um pouco de como ele aparece nas ideias de Aristóteles, Górgias e Platão.
PROPOSTA DE EXERCÍCIO
- Escolha uma palavra.
- Procure a etimologia dessa palavra.
- Procure o contexto em que essa palavra era usada originalmente.
- Relacione ao modo como ela é empregada atualmente.
- Anote as ideias que surgiram a partir desse exercício.